Patos E Sapatos

História do Peninha, de 1975.

Patos usam sapatos? A resposta a esta pergunta vai depender de quem são esses patos, é claro. Em Patópolis, por exemplo, a maioria dos patos não os usa. Donald e Peninha andam descalços, o Tio Patinhas usa polainas (um tipo de proteção para as pernas, feita de lã ou até mesmo de couro, que geralmente fica sobre os sapatos) nos pés nus, e somente o vilão Patacôncio anda calçado.

A coisa toda é uma brincadeira com as palavras “sapato”, “pato” e “chato”. Por exemplo: o Patacôncio usa sapatos, é pato, e também é muito chato. Será que ele poderia ser considerado um pato “chato de galochas“?

Outro elemento da história é a espionagem industrial, com o Peninha como publicitário das Indústrias Patinhas e alguns figurantes no papel de equipe criativa do Patacôncio (um dos quais, de cabelo comprido e liso, lembra um pouco as representações feitas de papai em várias outras histórias).

Isso, aliás, é algo recorrente nas histórias de papai: para conseguir copiar (e de maneira medíocre) o que o Patinhas faz com a ajuda de um sobrinho ou dois, seja no campo dos quadrinhos ou da publicidade, o Patacôncio precisa contratar toda uma equipe de profissionais renomados.

O principal espião desta história, o Zé Ratinho, é uma ratazana falante que participa de exatas quatro histórias, todas de autoria de meu pai, e contracena geralmente com o Doutor Estigma contra o Morcego Vermelho, mas também já foi parceiro de malfeitos do Professor Gavião. Ao que parece, ele não é o ajudante fixo de nenhum vilão, mas sim um malfeitor “de aluguel”.

Interessante (e hilária) é a decisão do Peninha de “pagar espionagem com espionagem”. Mas a “espionagem” do pato é feita menos para saber o que o vilão está planejando, e mais para infiltrar e causar confusão, quase como uma espécie de punição.

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A Propaganda É A Alma Do Negócio

História do Peninha, de 1973.

O Peninha é despedido novamente por dormir no horário de trabalho e resolve procurar outro emprego, dando início a mais uma aventura maluca.

As histórias do Peninha como “gênio da propaganda” são recorrentes com papai. Eu sinto muito em “tomar” mais uma história do Julio de Andrade, pois é assim que ela (ainda) está creditada no Inducks, mas o nome dela está na lista de trabalho, e a revista aqui na coleção. Para mim, não há dúvida.

O que acontece, a meu ver, é que há bastante similaridade entre o estilo do Julio e o do meu pai, principalmente porque quando o Julio entrou para a escolinha da Abril papai já era um artista reconhecido lá dentro e uma forte influência.

Uma diferença que eu percebo entre eles é que, com o Julio, os personagens trocam mais sopapos entre si ao longo das páginas do que na maioria das histórias do meu pai. E talvez seja justamente pela quantidade de “patadas” distribuídas liberalmente hoje, desde o primeiro quadrinho, que se deu o equívoco.

De resto, a história é bastante parecida com outra, já comentada aqui, chamada “O Grande Gênio”, que em 1975 coloca o peninha como “criativo” na agência do Pato Eurico. E o erro cometido pelo Peninha é o mesmo: querer usar uma só “fórmula” para todos os produtos, indiscriminadamente. O fato é que não é porque funcionou com um que vai funcionar com todos.

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A premissa da “campanha publicitária” é brincar com uma velha expressão da cultura brasileira. “Ele tem cara de quem comeu e não gostou” era algo que se dizia de quem fazia cara feia por estar chateado ou insatisfeito com alguma coisa. Mas, como no Brasil nem todo mundo tinha dinheiro nem para comer (e há quem não tenha até hoje), depois de algum tempo a piada passou a ser “não comeu e não gostou”.

E há também quem tenha aversão a certos ingredientes, como berinjelas, quiabos e coisas parecidas, mesmo sem nunca tê-los provado, e se recuse a comer alimentos feitos com eles. É nesse momento que geralmente começa a pressão de familiares e amigos no sentido de que a pessoa justamente tem de experimentar, fazendo a “propaganda” do alimento para quem não gosta dele.

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A “Agência Maccão” é uma referência à McCann Erickson, uma famosa agência de publicidade dos EUA que está presente em diversos países ao redor do mundo. Aqui no Brasil ela passou por várias fusões, mas continua na ativa.

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A Barbie é Nossa!

Hoje vamos alterar um pouco a ordem natural das coisas, por aqui.

A revista em questão é a Tio Patinhas número 203, de maio de 1982, mas a história de papai nesta revista não está listada no Inducks, porque faz parte da série dos projetos especiais que mais tinham a ver com publicidade do que com quadrinhos. Desenhada pelo Herrero, a historinha de 4 páginas marca o lançamento da boneca “Barbie” no Brasil.

Barbie

A personagem criada por papai para promover a boneca é uma glamourosa atriz de cinema, que vem ao país para fazer mais um filme e declarar que está “apaixonada”. Todo o glamour e a elegância da boneca-atriz, com seus muitos vestidos e acessórios que incluem um carro, uma banheira e até um salão de beleza próprios me lembra bastante o filme “Bonequinha de Luxo”, de 1961, com Audrey Hepburn.

Papai também faz uma menção – sempre em “código”, como era costume – ao ator Lauro Corona (sob o codinome Lauro Coroa), que era um famoso galã de novelas da época, como um possível “candidato” ao amor da Barbie. Mas, no final, o alvo de seu amor é bem outro: ela está apaixonada pelo Brasil, e anuncia que veio para ficar.

Outra curiosidade do exemplar que eu tenho desta revista aqui na coleção é a anotação feita por papai no topo da primeira página da história de lançamento do Biquinho, com roteiro de Gérson L. B. Teixeira e desenho de Irineu Soares Rodrigues. O personagem era um de seus preferidos, e ao que tudo indica, ele também gostou muito da história dos colegas.

Biquinho nascimento

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Cespinho e Paulistinha

Em algum momento das décadas de 1970/80 (algo como final de uma, início da outra, e as evidências apontam para o ano de 1979), A CESP (Companhia Energética de São Paulo) e a CPFL (Companhia Paulista de Força e Luz) encomendaram, juntas, um gibi promocional ao Departamento de Publicações Especiais da Abril.

Como de costume, a editora montou uma equipe composta pelos seus melhores para o projeto. Pelo menos uma fonte que eu vi no Google cita Waldir Igayara como criador dos personagens (que me lembram, aliás, os androides R2D2 e C3PO, de Guerra Nas Estrelas, de 1977), os argumentos das histórias ficaram a cargo de Papai, Julio de Andrade Filho e Paulo Paiva, e os desenhos são de Carlos Edgard Herrero. Também como de costume, não há créditos claros para nenhum dos artistas envolvidos, e é portanto bastante difícil saber exatamente quem fez o quê.

Segundo a lista de trabalho de papai, em 1978 ele escreveu as histórias para as partes de Recursos Naturais e Recursos Humanos desta revista.

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A revista em si pretende ser uma aula completa sobre como o Governo do Estado de São Paulo produzia e distribuía energia elétrica naquele tempo, incluindo planos para o futuro. Começando com um muito breve histórico das duas empresas, as histórias vão explorando vários aspectos da indústria energética, citando as usinas hidrelétricas, principalmente, mas também outras fontes fósseis e renováveis, indistintamente e de modo muito vago (algumas das quais até hoje ainda não são bem aproveitadas), como a energia das ondas do mar ou o aproveitamento dos gases provenientes de depósitos de lixo.

Como nas encomendas dos ministérios militares, já citadas aqui, os roteiros das várias histórias seguem um esquema bem preparado pelo cliente e recheado de fatos, mapas e até uma fotografia aérea de uma usina hidrelétrica, que em alguns momentos “engessa” bastante a coisa toda. É claramente uma peça promocional, sem pretensão alguma de ter um roteiro ou uma trama.

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São 32 páginas e 6 histórias, a saber: A Energia (uma introdução), Engenharia e Construções, Transmissão, Distribuição, Recursos Humanos (uma peça de recrutamento de pessoal) e Recursos Naturais (que hoje em dia seria chamada “responsabilidade social e ambiental”). Entre uma história e outra há também joguinhos temáticos, como caça palavras e jogo dos cinco erros.

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Uma Idéia Bem Mastigada

História de 1975, que combina o tema da agência de publicidade do Pato Eurico com as invenções do Pardal.

Sempre à caça de novas ideias e às voltas com publicitários medíocres, o Eurico recorre ao Prof. Pardal para que invente uma máquina de fazer propaganda.

O robô inventado, um suposto “remake” de outro de mesmo nome, é um brutamontes, mas tem lá as suas ideias. Só que ninguém pode garantir que elas sejam melhores do que as ideias dos humanos, ou mesmo diferentes delas.

Ou será que toda ideia precisa mesmo ser genial? Será que toda campanha publicitária precisa realmente ser totalmente original, mesmo que seja para vender produtos corriqueiros?

A trama se baseia em duas “desconfianças” fundamentais: a primeira diz respeito à fobia que as pessoas tinham da alta tecnologia antes da popularização da Internet, e a segunda é a relação ambígua que papai tinha com o mundo da propaganda e marketing, a desconfiança que ele tinha de seus profissionais, juntamente com o horror à falta de criatividade de certas campanhas publicitárias. Eram poucos os publicitários que papai realmente admirava, e eles sabem quem eles são.

O interessante é que, depois de terminar o invento, o Prof. Pardal adormece e pouco participa da história. Quem fica a cargo de entregar o monstro de lata ao cliente é o Lampadinha que, claramente, é pequeno demais para controlar o treco.

Nelson II