O Novo Cifrônio

Nesta história de 1973, Tio Patinhas resolve substituir o “secretário-guarda-motorista” Cifrônio por um autômato inventado pelo Professor Pardal.

Já nos anos 1970 havia uma preocupação, fomentada principalmente pelos filmes de ficção científica, de que um dia no futuro as máquinas poderiam substituir os seres humanos no mercado de trabalho.

E o robô do Pardal até que tenta, mas tem muitas desvantagens em relação ao empregado humano, entre elas a impossibilidade de ter uma carteira de motorista, por exemplo. A máquina é também muito mais desastrada que o Cifrônio, e cumpre ordens ao pé da letra, o que acaba causando ainda mais confusão.

Nota para a “profética” fala do Prof. Pardal, quando traz o robô “Cifrônico” ainda embrulhado ao escritório do Tio Patinhas. A turma do Casseta e Planeta provavelmente nem sabe de onde eles tiveram a ideia para esse bordão. Mas eu não duvido que eles liam quadrinhos. 😉

Pardal patinhas

O Feitiço Da Vila

História do Zé Carioca, publicada em 1984.

O título da história é inspirado numa canção de Noel Rosa, composta em 1934 para homenagear seu bairro, Vila Isabel, e as três bruxas (na verdade Maga Patalójika, Min e Bruxa Vanda) são inspiradas nas três bruxas de Macbeth, peça teatral de William Shakespeare, considerada “amaldiçoada”, e cujo nome não deve ser dito em voz alta.

Na peça, as três bruxas abrem a trama com uma profecia: “Salve, Macbeth! Salve, Barão de Glamis! Salve, Macbeth! Salve Barão de Cawdor! Salve, Macbeth! Ainda serás rei!”

Nesta história não é diferente: “Salve, Zé Carioca, o ser mais feliz da terra. Que nunca precisou trabalhar pra viver. E que um dia será milionário!”

Elas invertem as personalidades de todos os amigos do Zé para se divertirem, o enchem de dinheiro e presentes, e ele estava até gostando da ideia, até o momento em que percebeu que a personalidade da Rosinha também havia sido invertida.

É aí que as bruxas acabam descobrindo que o nosso herói dá mais valor ao amor da Rosinha do que a todo o dinheiro do mundo.

No final, a história vale também como reflexão filosófica: o que é mais importante neste mundo? O dinheiro ou o amor?

Inauguração Com Muita Ação

História do Zé Carioca, de 1981.

Atingido na cabeça por uma máquina fotográfica antiga jogada janela afora pelo Nestor, o Zé se inspira para mais um de seus planos mirabolantes: resolve se infiltrar, juntamente com o amigo, na inauguração da “Boate Aligator”.

Eles aproveitam a chegada do carro do “Jornal de Hoje” para entrar na festa “na cola” dos jornalistas. Este era o nome de um jornal que existia em Campinas, e no qual papai tinha uma coluna na época, chamada “Palavra e Traço”.

“Ricardo Avaral”, chiquérrimo dono da boate na história pode ser uma referência a Ricardo Amaral, o assim chamado “rei da noite carioca”. E o nome que o Zé dá a ele, “Zé de Thormes”, é certamente uma alusão a Jacinto de Thormes, pseudônimo do jornalista Maneco Müller, pioneiro do colunismo social no Brasil.

Era dessa maneira que papai ia aproveitando eventos de sua própria vida nas histórias, além de fazer alusão a grandes nomes e fatos da cultura brasileira.

O resto são as confusões de sempre, que nem por isso deixam de ser engraçadas. A piada final (“precisava ficar tão bravo só porque não sabe a resposta?”) vem de uma piada de salão que papai costumava contar, onde o leão sai perguntando aos outros animais da floresta a respeito de “quem é o rei dos animais”. Os outros, sempre mais fracos, respondem que é o leão, é claro. Até que o leão se depara com o elefante, que por ser mais forte lhe dá uma surra em regra. É aí que o leão sai com essa “conclusão”.

1313 No País Dos Azarados

Escrita em 1978, esta história só foi publicada, mesmo, em 1981.

Mais uma da séria “Metralhas Através da História”, esta é dedicada especialmente ao primo azarado e, como todas as outras, narrada pelo Vovô Metralha.

A narrativa se passa na Roma antiga, e o nome do antepassado é “Azaradvs XIII-XIII”. Os diálogos estão todos na segunda pessoa do plural, para simular um modo antigo de falar, com algumas frases em “Latim de gozação”.

Há também uma participação especial do Imperador Nero, e uma ou outra informação histórica correta, como o nome do Gládio, a espada curta de dois gumes usada pelos antigos soldados romanos e que lhes rendeu o nome de “gladiadores”. Além disso, a “Via Appia”, de uma das plaquinhas no caminho, é uma “rua” da Roma antiga que existe até hoje.

(Dica: hoje em dia é inclusive possível “passear” por essa Via no Google Street View, algo que eu recomendo de todo o coração.)

Nesse tipo de história com citações históricas papai era muito exigente a respeito da caracterização dos personagens, caprichando bastante no rascunho e fazendo mil recomendações aos desenhistas. No caso, foi dedicada uma atenção especial às armaduras dos soldados romanos, certamente obrigando o desenhista a fazer alguma pesquisa, também.

O Caso das Quatro Manchas

Na revista Almanaque do Mancha Negra, de 1984, encontramos duas histórias de papai.

A primeira é “O Caso das Quatro Manchas“, claramente inspirada em livros policiais e de mistério, como “O Caso dos 10 Negrinhos”, de Agatha Christie.

E esta história tem realmente todos os elementos de um bom mistério policial, desde a ameaça do Mancha Negra, pelo envio de quatro borrões aos seus inimigos, até o suspense eletrizante e o desfecho surpreendente, onde o verdadeiro rosto do vilão é finalmente revelado.

Mancha negra

Parece que, com o tempo, papai pegou o jeito das histórias do Mickey, adaptando-as ao seu estilo. Esta história não deve nada aos próprios clássicos da literatura policial, de mistério e de suspense.

A outra história de papai nesta revista, “O Invencível Mancha Negra”, publicada originalmente em 1974, também é um belo exercício de criatividade.

Nela, papai apela à inteligência dos leitores que, se forem atentos, perceberão que o comportamento do Mancha durante os assaltos parece meio “engessado”.

Ao final, a surpresa: o “Mancha Invencível” é na verdade um robô, criado pelo vilão para praticar crimes em seu lugar.

O Artista e o Arteiro

A revista Almanaque Disney 80, de 1974 contém várias histórias de papai, incluindo esta, que a meu ver é a mais simples, a mais despretensiosa e a mais engraçada.

A proposta é bem básica, baseada na paixão do gato Ronron por peixes.

Ronron pensa que o Peninha está indo pescar na lagoa de Patópolis, e resolve ficar por perto para ver se consegue ganhar um peixe. Mas acaba se surpreendendo ao ver o que o Peninha realmente foi fazer. Pior, chega perto demais e acaba se dando mal.

Parte da graça da história é a desconfiança que o Peninha tem de que está sendo seguido, mas passa a história inteira sem conseguir ver o gato, mesmo segurando-o pela cauda.

Há alguém da Sociedade Protetora dos Animais na platéia? 😉

A Feijoada e o Sono

História publicada na Revista Zé Carioca 1359, em 25 de novembro de 1977.

O título é uma paródia do romance “O Feijão e o Sonho” do escritor brasileiro Orígenes Lessa, publicado em 1938. Mais um dos clássicos da literatura que papai certamente leu, como todos de sua geração, porque consta que foi um sucesso estrondoso na época.

No morro de casebres de madeira, os amigos do Zé se reúnem para fazer uma feijoada, e não convidam o nosso herói, porque como ele mesmo diz, ele só contribui com “a boca e a barriga”.

Rejeitado pelos amigos, ele então cria um “plano infalível” (ué, é só a concorrência que pode?) para conseguir comer a bendita feijoada. O “sono” é parte desse plano.

Nesta mesma revista há outra história de papai, do Mickey e Pateta, de nome “A Volta do Dr. Espectro“. Desta vez, quem tem o “sonho profético” é o Pateta, na abertura da história, que gira em torno do plano malévolo de um cientista maluco para dominar a mente de todos os figurões de Patópolis.

Creio que o Mickey detetive era um personagem um pouco sério demais para o gosto de papai. Estou ciente de certas críticas que andaram circulando por aí que as histórias do Rato não eram exatamente as suas melhores, mas esta tem os seus bons momentos, especialmente quando os papéis tradicionais dos personagens são invertidos: Tio Patinhas distribui dinheiro na rua, o Coronel Cintra pratica assaltos, e até o próprio Mickey se vê fazendo o que preferiria não fazer, mas a “força externa” que causa isso é outra… 😉

Que Rei Sou Eu?

Zé Carioca sonha que é rei, e acorda atrasado para o ensaio da Escola de Samba Brejeiros da Tijuca, nesta história de 1975.

Ainda não há menção à Unidos de Vila Xurupita, e o Zé ainda mora num barraco, que a Rosinha faz desabar ao bater a porta com força.

O vilão da história é João Ratazana, o mesmo da primeira história do Zé escrita por papai publicada. Ele tenta assaltar a bilheteria enquanto todos estão assistindo ao ensaio cheio de trapalhadas, e o Zé acaba caindo sobre ele, mais ou menos como na outra história.

Interessante a menção do Zé a sonhos proféticos. Papai e eu, ao longo dos anos, tivemos alguns bem curiosos…

O Monstrengo Vermelho

A revista que eu peguei hoje de minha coleção, a Peninha N° 50, de 1984, traz duas histórias de papai (das 4 publicadas – 50% de aproveitamento, nada mau, não?)

A primeira é uma variação sobre o tema “época das cavernas”, em que um alter-ego primitivo do Peninha cavalga dinossauros e disputa com um brutamontes, do jeito desastrado de todos os “Peninhas”, o amor da Glória. O exercício de imaginação sempre é válido, e os clichês fazem parte da cultura dos quadrinhos. Impossível faze-los sem usar alguns, ou muitos, a critério do roteirista. Aliás, muitas vezes, quanto mais clichês, melhor.

A segunda, que dá título a este post, é a real “cereja do bolo” da revista, e uma das mais criativas do repertório do Morcego Vermelho.

Doutor Zung, cientista louco com direito a plaquinha na porta de casa, toma uma poção que o transforma e o faz roubar bolos de chocolate. E eis que o Morcego Vermelho, acidentalmente, toma da poção e vira também ele um monstrengo faminto por guloseimas.

A vantagem do Morcego, e a genialidade de papai, é que o instinto de herói acaba suplantando o do monstro, e ele consegue usar seus novos poderes para fazer o bem. Quer dizer, mais ou menos… 😉

Os Três Metralheiros

Publicada originalmente na revista Mickey 328 de 1980, esta história é parte da série “Metralhas Através da História”, e foi premiada com o 6° Prêmio Abril em 1981 como Melhor História Nacional (Ou Feita no Brasil).

A narrativa se alterna entre as peripécias dos Metralheiros no Século XVII, contadas pelo Vovô Metralha, e as interrupções dos Metralhas modernos com todo tipo de comentários e perguntas, cada um mais disparatado que os outros.

Nota-se a especial participação do Primo Azarado, o 1313, cujo antepassado até que não se dá assim tão mal no final da história (ou quase isso). 😉

A adaptação contém todos os elementos da história clássica original, adicionados de mais algumas pitadas de ironia e crítica ao original, como o comentário do Vovô que “os três mosqueteiros sempre foram quatro e ninguém nunca reclamou”.